Bem-vindo(a), Fulano da Silva

Quer investir em empresas que valorizam diversidade de raça e gênero? Agora há um índice acionário para isso

16 ago 2023

Os avanços das empresas listadas na B3 em relação às políticas de sustentabilidade, a partir de hoje (15), também poderão ser analisados pela lupa de gênero e raça na bolsa de valores do Brasil. Um total de 75 companhias foram agrupadas e formam a carteira teórica do primeiro índice criado para ser referência em teses de investimentos baseadas em diversidade.

Chamado de Idiversa, o novo índice oferece a possibilidade de avaliação diferente do que do Índice de Sustentabilidade Empresarial (ISE B3), lançado em 2005, para ser o indicador do comprometimento com a sustentabilidade empresarial. A inovação do Idiversa está em se debruçar sobre a análise dos quadros funcionais – e não só sobre os conselhos de administração – para mapear, simultaneamente, questões de interseccionalidade de gênero e raça.

O índice também é o primeiro da América Latina com esse recorte de propósito.

Para chegar à composição da carteira, foram usados três critérios. A partir de dados públicos dos formulários de referência, conforme prevê Resolução 59 da Comissão de Valores Mobiliários (CVM),a B3 calcula uma nota para cada companhia, o score diversidade, levando em conta seu setor de atividade. Ou seja, como se dá, na prática, a composição daquela companhia como um todo, considerando a presença de mulheres, de pretos e pardos, ou indígenas no conselho de administração, na diretoria estatutária, e dentro do quadro de funcionários.

Esses dados são confrontados com outras empresas do mesmo setor (o enquadramento é o mesmo comumente usado nos demais índices da B3) e com dados demográficos do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística).

Ana Buchaim, vice-presidente de Pessoas, Comunicação, Marketing e Investimento Social da B3, pondera que, ao se valer de informações já previamente aferidas pela CVM, o índice adiciona uma camada de segurança para auxiliar na tomada de decisão do investidor.

“O Idiversa adota critérios objetivos e isso é importante para destravar o desenvolvimento do mercado a partir de novos produtos de fundos ou para ajudar o investidor focado em escolher ações individualmente (‘stock picking’) e que buscam por companhias com melhor desempenho financeiro em relação a gênero e raça”, sustenta Ana.

Por outro lado, a referência ainda não permite identificar o avanço das empresas acerca da participação de LGBTQIA+ nem de pessoas com algum tipo de deficiência (PCDs) na composição das companhias.

Ana explica que neste momento ainda não há dados públicos sobre os dois recortes junto à CVM. “De maneira geral, nas empresas não há uma só forma de sistematizar as informações de profissionais com algum tipo de deficiência. E no caso de funcionários LGBTQIA+, há barreiras para a própria coleta das informações pelas companhias”, diz.

O Idiversa é o décimo índice ligado à sustentabilidade, de maneira geral, da B3 e é um dos compromissos firmados em 2021 e a ser cumprido até 2024 enquanto companhia listada na bolsa.

“Sabemos que a jornada de diversidade em ESG é questão de tempo e comprometimento. O índice ajuda as companhias a se comprometerem com diversidade em todos os níveis hierárquicos. E na medida que vamos trazendo mais dados e informações sobre representatividade, o índice também vai evoluir”.

Como é formado o Idiversa?

A primeira carteira do Idiversa é formada por 75 empresas, com 79 ativos (ações e units) exclusivamente de companhias listadas na B3, representando dez setores da economia. A carteira passará por reponderações em janeiro, maio e setembro de 2024. O rebalanceamento segue o cronograma usual da B3, quando as composições de todos os demais índices são divulgadas.

Os 10 ativos com os maiores pesos na composição da carteira são

Para fazer parte do índice, é preciso atender aos critérios de elegibilidade: ter ao menos um membro dos grupos sub-representados no conselho de administração e um membro na diretoria estatutária.

Depois, é preciso ter a nota maior ou igual à média do setor, considerando a presença de mulheres, pretos e pardos, ou indígenas; menos um desvio padrão do setor, explica a B3. O score diversidade serve para comparar a performance da empresa com o setor. Por exemplo, bancos são comparados com bancos. E, a partir dessa ponderação, é avaliado o momento da empresa frente aos dados demográficos. A intenção é colocar o setor inteiro sob a ótica das estatísticas demográficas para que se verifique o ritmo de evolução de uma determinada companhia frente às concorrentes.

Para ser elegível, a empresa precisa, ainda, apresentar liquidez em bolsa. É preciso que a frequência de negociabilidade seja maior do que 99%, que a empresa tenha participado de 95% dos pregões e não seja penny stock, como são chamadas as ações negociadas a valores menores do que R$ 1.

O índice é considerado de retorno total, com reinvestimento na própria carteira. Mais informações podem ser obtidas no link.

Carteira Idiversa agosto/setembro por setores

Mulheres e pessoas negras seguem distantes dos cargos de liderança

Na última semana, ou seja, antes do lançamento do índice, a B3 divulgou alguns dados que demonstram o quanto mulheres e pessoas negras seguem distantes dos cargos de alta liderança das empresas de capital aberto.

De cada 100 empresas com ações negociadas em bolsa no Brasil, 55 não têm mulheres em cargos de diretoria estatutária, e 36 não têm participação feminina entre os conselheiros de administração. Em relação a cor e raça, a proporção de companhias com ao menos uma pessoa negra (preta ou parda) em um desses órgãos não passa de 11%.

Esses dados estão no terceiro estudo “Mulheres em Ações”, feito pela B3, a bolsa do Brasil, a partir de informações prestadas pelas companhias em documentos públicos. O mapeamento foi feito com os dados de 343 empresas listadas em quatro segmentos de listagem: Básico, Nível 1, Nível 2 e Novo Mercado, que entregaram seus Formulários de Referência até o último dia 20 de junho. O retrato mostrado pela análise desses documentos, em relação a gênero, é o seguinte:

  • 55% não têm mulheres entre seus diretores estatutários (no estudo de 2022, esse percentual era de 61%);
  • 36% não têm mulheres no conselho de administração (em 2022, esse percentual era de 37%);
  • 29% têm apenas uma mulher na diretoria estatutária (eram 26% em 2022);
  • 39% têm uma mulher entre os conselheiros de administração (em 2022, esse percentual era de 38%);
  • 7% têm três ou mais mulheres entre os diretores estatutários (eram 6% de 2022);
  • 7% têm três ou mais mulheres como conselheiras de administração (em 2022, eram 8%).

Os números indicam uma evolução na participação feminina na diretoria estatutária, mas o quadro geral ainda é distante do ideal.

Na avaliação dos dados raciais, das 343 companhias analisadas no levantamento, 305 (88,9%) declararam não ter nenhuma pessoa parda na diretoria estatuária, e 311 (90,7%) não têm nenhuma pessoa parda no conselho. E apenas quatro empresas (1,1%) disseram contar com três ou mais pessoas pardas na diretoria estatuária, mesmo número registrado nos conselhos de administração.

A participação de pessoas pretas na alta liderança é ainda menor: elas não ocupam cargos de diretoria estatutária em 337 (98,2%) das 343 companhias e não estão nos conselhos de administração de 328 empresas (95,6%). Nenhuma empresa tem duas ou mais pessoas pretas na diretoria estatutária, e seis (1,7%) têm apenas uma pessoa autodeclarada preta nesse órgão. Em relação aos conselhos, eles contam com uma única pessoa preta em 13 companhias (3,8%). Empresas com dois (uma companhia) e com três ou mais (também uma companhia) conselheiros de administração pretos são casos isolados.