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A corrida das empresas para cumprir a lei de proteção de dados

20 dez 2022

Em vigor desde 2020, legislação foi considerada um marco por criar regras para os setores público e privado; mudança aumentou a demanda pelos serviços dos escritórios de advocacia.

Num cenário em que a economia é cada vez mais digital, a Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (LGPD) fez aumentar a demanda pelos serviços dos escritórios de advocacia no Brasil. Nos últimos anos, as principais bancas do setor reforçaram e ampliaram as suas equipes, além de endereçar a questão tecnológica de forma multidisciplinar, envolvendo diferentes equipes. Aprovada em 2018 e em vigor desde 2020, a legislação é considerada um marco, porque criou regras e princípios de transparência em relação ao uso e tratamento de dados nos setores público e privado. As empresas precisaram, entre outros pontos, desenvolver protocolos para evitar o vazamento de informações de clientes e funcionários, criar um departamento para cuidar exclusivamente do tema e nomear um encarregado de ser o responsável pelos dados da companhia, chamado de Data Protection Officer (DPO, ou chefe da proteção de dados). MAIS SOBRE PROTEÇÃO DE DADOS No mar de dados da internet, não distinguimos o importante do fútil.

O futuro dos dados sobre saúde no Brasil Os escritórios entraram em cena porque, para as companhias, se tornou fundamental cumprir a legislação em vigor. Hoje, qualquer incidente de vazamento de dados pode levar a uma multa milionária – o valor pode chegar a R$ 50 milhões. Portanto, ter um protocolo bem definido no caso de um incidente passou a ser fundamental. “Com a mudança para a economia digital, o dado do consumidor tem um valor muito grande para as empresas”, afirma Fabricio Cardim de Almeida, sócio do escritório Mello Torres Advogados.

A primeira onda de demanda de trabalho se deu com as companhias multinacionais, que já lidavam com leis de proteção de dados em seus países sedes e precisavam, então, adequar a legislação das suas afiliadas e controladas no Brasil. As grandes empresas nacionais vieram em seguida e marcaram um segundo movimento. “Contratamos muita gente, e essa área do escritório cresceu substancialmente num espaço de tempo bastante curto”, afirma Paulo Brancher, sócio do Mattos Filho. São cerca de 35 pessoas cuidando de proteção de dados.

Atualmente, o trabalho dos escritórios passou a ser mais de manutenção de protocolos e consultoria para lidar com as novas diretrizes que são publicadas frequentemente pela Autoridade Nacional de Proteção de Dados (ANPD), além das ações em curso na Justiça. E elas são crescentes. Um mapeamento realizado pelo JusBrasil apontou que o número de decisões relevantes envolvendo a LGPD saltou de 274 para 655 entre o ano passado e 2022.

“Há uma alteração do tipo de trabalho. Entre 2018 e 2020, a maior demanda era pela implementação da LGPD, porque estávamos auxiliando as empresas a fazer o programa de compliance, a cumprir todos os requisitos e orientações da lei”, diz Larissa Galimberti, sócia de tecnologia do Pinheiro Neto Advogados. O escritório tem cerca de 80 profissionais envolvidos diretamente ou indiretamente com o trabalho de tecnologia.

Trabalho preventivo para evitar ações

O levantamento do JusBrasil, realizado em parceria com o Instituto Brasileiro de Ensino, Desenvolvimento e Pesquisa (IDP), analisou 1.789 documentos que tratavam da lei de proteção de dados de setembro de 2020 a setembro de 2022. A maior parte deles vinha do Tribunal de Justiça de São Paulo, com 110 decisões.

Em seguida, apareceram Bahia (11) e Rio Grande do Sul (10). “O que a gente tem procurado fazer com os clientes é o trabalho preventivo, o trabalho de treinamento e educação para estar o mais preparado possível se um incidente ocorrer”, afirma Tatiana Campello, sócia das áreas de propriedade intelectual, inovação e tecnologia e privacidade de dados e cibersegurança do Demarest.

Na rede Assaí Atacadista, o trabalho para se adequar à LGPD começou no segundo semestre de 2019. A empresa levou um ano apenas para fazer um mapeamento dos departamentos, dos fluxos internos, e das atividades que atuavam ou poderiam envolver com dados pessoais.

“É um trabalho que não para, porque vira e mexe estamos criando promoções, sistemas novos que implementamos, procedimentos, que podem vir ou não ter contato com dados pessoais. É preciso estar preocupado em criar esses procedimentos dentro da lei”, afirma Sadik Sarkis, diretor jurídico e compliance da companhia.

A empresa já estava totalmente ajustada à LGPD em agosto de 2020. O trabalho passou, então, a ser mais uma “lição de casa” com o desenvolvimento de políticas e procedimentos internos para garantir que a companhia tenha uma boa prática no tratamento de dados. “Nós nos adequar à lei, mas a expectativa é que muito provavelmente será preciso dar uma mexida, uma afinada”, afirma Sarkis.

:: Passo atrás

As pequenas empresas ainda estão um passo atrás e tiveram mais dificuldade para se adaptar à legislação. Elas aceleram a implantação mais recentemente, conforme a ANPD passou a emitir regulamentações que tratam da lei. A autoridade determinou, por exemplo, que nem todas as companhias menores precisam de um DPO.

“Não é um bicho de sete cabeças, mas precisa gastar um tempo para conversar com todo mundo da empresa, ver como se trata dados pessoais na companhia e preparar toda a documentação”, diz Tania Liberman, sócia da área de tecnologia, propriedade intelectual e proteção de dados do Cescon Barrieu Advogados. O escritório aumentou de 5 para 7 a quantidade de advogados que cuidam do tema.

Nas empresas que oferecem crédito digital, a discrepância entre grandes e pequenas companhias ficou evidente. Por ser um setor com intenso uso de dados sensíveis, as companhias menores tiveram de manter um DPO. “As fintechs menores têm mais desafios para implementar o programa proposto pela ANPD”, afirma Claudia Amira Fiaschitello, diretora executiva da Associação Brasileira de Crédito Digital (ABCD). “Elas têm uma estrutura menor, menores recursos humanos e financeiros.”

A associação tinha como pleito a liberação da necessidade de um encarregado de dados, mas ela não foi atendida pela autoridade. “Existem diversos documentos que precisam ser produzidos e que fazem parte da LGPD, processos que envolvem um esforço razoável e de muita dedicação”, afirma Fiaschitello. Ela diz que, apesar das dificuldades, as empresas do setor estão seguindo as normas em vigor da proteção de dados. “Há uma grande conscientização do tema e preocupação, independentemente do porte, de ela estarem em compliance com a LGPD.”

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